quinta-feira, 19 de maio de 2011

Os primeiros anos de faculdade - O Gol GL 1.8 1990 branco star

Meu pai sempre teve uma preocupação muito grande. Fazer com que eu e meu irmão fossemos independentes financeiramente, e um fato que ajudaria a alcançar esse objetivo é o estudo. Sempre frequentei uma boa escola, independente da crise e do salário do meu pai. Meu velho sempre colocou a formação em primeiro lugar, para os seus dois filhos. Ele sempre acreditou que a educação muda o homem e o seu patamar. É a maneira mais simples e mais trabalhosa de se conseguir as coisas. Hoje, com quinze anos de formado, agradeço a ele cada estímulo, cada bronca e cada esforço que ele fez por mim nos vinte e quatro anos que vivi financeiramente dependente dele. Meu pai abriu mão de viagens, carros melhores, até de sua própria atualização acadêmica para que eu e meu irmão pudéssemos estudar.

Acho que é o que precisamos no Brasil. Educação. só ela muda a condição social de um indivíduo. Esse começo de ano fiquei muito contente, o filho da moça que trabalha em casa entrou na universidade federal de Viçosa. Se ele seguir firme neste caminho, com certeza os filhos dele terão oportunidades diferentes daquelas que a mãe dele teve.

Bom, voltando ao ponto, eu estudei muito durante o ano de 1990. Tinha sido reprovado no vestibular e meu pai havia me dado um ultimato. Ou entrava na universidade pública ou teria que trabalhar para pagar a faculdade. Aquele ano de 1990 seria o último ano que meu pai pagaria curso pré-vestibular para mim. Depois do tombo na Fuvest, resolvi estudar de verdade. Durante o ano inteiro nunca faltei em uma aula sequer. Estudava de seis a dez horas por dia. Fiquei magro, levava uma vida de monge. Nada de namorada. Saia de casa seis da manhã, voltava as duas da tarde. Dormia uma hora e estudava até acabar toda a matéria. As vezes, quando apagava a luz do quarto, ouvia o relógio da sala bater meia noite.

Na metade do ano eu já era o segundo melhor aluno do Anglo Tamandaré em exatas, dentre cinco salas. Nem eu acreditava nisso, sempre fui um aluno mediano. Tinha colocado na cabeça que queria estudar na Escola Politécnica, mas achava muito difícil conseguir. Nesta época não tinha carro e nem podia usar os carros dos meus pais. O velho 1300L e um Monza SL/E 89 da minha mãe, primeiro carro zero comprado por ela com o seu próprio esforço. Meu pai exigia grande disciplina da minha parte. Eu ficava bravo, achava injusto, mas hoje agradeço a ele por tudo que já consegui.

Chegou a reta final. Fiz os dois únicos vestibulares que me interessavam, a Fuvest e a Unicamp. Eu não queria ter que trabalhar para pagar meus estudos, nada contra, mas eu estava decidido a tentar até conseguir. Para me incentivar, meu pai me prometeu, caso entrasse na Poli, um carrinho usado. E ainda, se ele tivesse condições, guardaria o valor da mensalidade da faculdade particular para me ajudar no meu começo de vida. Fiz o vestibular e fui descansar em Dourado. Não podia ver livro na minha frente. Fora um ano difícil, tinha perdido uns vinte quilos, foi um período de muito foco e desgaste.

No dia seis de fevereiro, aniversário do meu pai, saiu a lista da Fuvest nos jornais. Na noite anterior, nos cursinhos. Eu estava longe de São Paulo e tinha deixado para ver a lista nos jornais. Naquela noite eu estava tranquilo em Dourado, quando encontro um colega da cidade, dizendo para eu voltar para casa, meu pai havia ligado contando que eu tinha entrado na Escola Politécnica. Meu pai chorava de alegria, de certa forma eu tinha conseguido por nós dois.

Foi uma das maiores realizações acadêmicas que eu alcancei. Essa foi a prova que, quando se quer uma coisa, quando se dedica de verdade, alcançamos o objetivo. Sempre quando tenho uma dificuldade no trabalho eu resgato aquele ano de 1990 e me dedico ao máximo. Claro que as variáveis hoje são outras, mas a essência é a mesma. Dois meses mais tarde descobri que havia sido o sexto colocado entre todos os aprovados, não só da Poli, mas também da Matemática. Foi demais, meu pai não cabia em si de felicidade, acho que foi o melhor presente que pude devolver para ele, pois sem a sua ajuda eu não teria conseguido nada. espero poder ser um bom pai, como o meu foi e é.

Início de 1991, vida nova. Faculdade. Foi um tremendo choque. A Poli é uma excelente escola, mas tem inúmeros defeitos. A primeira lição é aprender a se virar, nada vem mastigado como vinha no colégio. Lá tirei meu primeiro zero, as semanas de prova eram um verdadeiro inferno. É um mundo impessoal, você faz o que você quer e aprende a assumir as conseqüências dos seus atos. Ninguém te cobra. O que acontece, no final, é que se você não se dedicou o suficiente, é bomba na certa. Conheço pessoas que arrastaram dez anos na Poli e não se formaram. Como eu não queria isso para mim, mesmo a contra gosto fui em frente e me formei. Hoje, por incrível que pareça, tenho saudades da Poli e sou grato à Escola por muito do que consegui na minha vida.

Entrei, chegou a hora do carro. Em abril de 91, meu pai me disse para procurar um carro usado. Um Fusca de dez anos. Eu detestava Fusca. Não bastava o do meu pai? Perguntei se poderia ser um Opala 76 ou coisa do gênero. Engraçado é que nem cogitei um Dodge. Realmente me esqueci destes carros por muitos anos. Mostrei alguns anúncios, inclusive o de um Gol Gl 1.8 90 preto, com 1.100 km rodados. NEsta época de inflação galopante as pessoas compravam carro para proteger o capital. Parece piada, mas é a mais pura verdade.

Nem sonhava em ter um carro destes. Era muito fora. Para meu espanto meu pai falou para ligar para o anúncio, e numa noite de abril fomos até o Tatuapé, na rua Emilio Malet. O carro era de um casal que o comprara para investimento. Quando meu pai fechou negócio, fiquei desnorteado. Nem acreditei que eu teria um Gol 1.8 preto! Era o que um garoto poderia desejar de mais legal, depois dos Gol GTI e GTS, muito mais caros.

Ganhar um carro me fez desviar do foco da escola, e no primeiro semestre já tomei duas bombas. Corria feito um louco, fiz muita bobagem com esse carro. Tanto que o destino dele foi ficar debaixo de um caminhão, na noite do dia 29 de dezembro de 1991. Não sei como eu e os outros três amigos não morremos. Deus não quis que fossemos aquele dia. Ms o Gol foi perda total.

Passei aquelas férias de cama. Rasguei a boca, quebrei o braço esquerdo e machuquei o peito no volante, apesar de estar usando cinto. Estava puto da vida comigo mesmo, por causa da besteira, da imprudência. Meus filhos, se vocês lerem isto um dia, espero que façam diferente.

Em fevereiro de 1992, ganhei um segundo gol, idêntico ao primeiro, porém branco. Com 6.800 km rodados. Esse carro é inesquecível para mim. Eu adorava meu Gol e choro até hoje por tê-lo vendido. Era estupidamente liso, impecável. Claro que troquei rodas e mais um monte de tranqueiras, mas o carro era muito legal. Com este carro dei carona pela primeira para aquela que viria a ser minha mulher, mãe dos meus filhos. Tudo que cuidei de um carro de uso se esgotou neste Gol, hoje eu não tenho a mínima paciência de lavar um carro. Ele não tinha um risco sequer, o cofre era mais limpo que consultório de dentista. Interior impecável. E andava muito bem, para os padrões de 1992.

Essa fase da vida foi muito boa. As preocupações? Não havia, apenas estudar. Passava muito tempo com meus amigos de infância, os amigos da rua. O Rogério (Alemão) e o Marcelo (Febem). Éramos inseparáveis. O Alemão é meu amigo desde 1980, e continua até hoje. Hoje nós estamos bem diferentes das fotos da época. O Marcelo sumiu, nunca mais soube dele desde que mudaram do bairro. O Alemão está gordo, o Marcelo careca, eu com cabelos brancos... Enfim, amadurecemos. O engraçado é que quando nos encontramos ocasionalmente na rua, sentamos em frente a casa do Alemão e jogamos horas de conversa fora, como fazíamos nos anos 80. Só que agora rodeados das crianças. Esse tipo de amizade surge apenas na infância. Guardo com muito carinho esse tempo.


























O Gol, em frente à casa dos meus pais. Tinha jeito de mau. 

Neste Gol fiz o que nunca mais fiz em nenhum carro, que é modificar. Troquei rodas (algumas vezes), som, andava sem placas. enfim, foi uma fase. Esse carro chamava a atenção pelo seu estado de zero. Nunca bati o meu Gol. Era um carro impecável. Investigando o DPVAT achei informações sobre o dono, até poderia tentar encontrar o carro, talvez recompra-lo. Mas prefiro lembrar dele como ele era. E de tudo de legal que vivi nos meus anos de Poli, com meu Gol, meus grandes amigos e minha então futura mulher.


































As fotos, na ordem:

1 - Meu Gol, nos fundos da casa de Dourado. Foi uma época muito boa
2 - Olha só o motor. Cinco anos de idade e zero.
3 - da esq para a dir: Febém, eu e o Alemão. Guaecá, São Sebastião. 1993.
4 - Meu quarto de nerd. passei muito tempo nesta mesa estudando.
5 - Formando da 100a turma da EPUSP. Minha mãe, eu e o Febém. Neste dia ele tomou o maior porre...




Agradeço ao meu pai por tudo isso.

abraços!

Vital

6 comentários:

  1. Muito legal essas lembranças, Vital !!!
    Eu passei em Publicidsade na FIAM/FAAM e FAAP em fins de 1986, direto da escola, sem cursinho...Foi mais ou menos como vc., optei pela FAAP por ter mais prestígio no curso naquela época...E também ganhei o meu primeiro carro, que eu escolhi: um VW 1600 TL branco, ano 1971, de única dona, 500% original e baixíssima quilometragem, adquirido no Anhembi em fins de 1987 pro meu aniversário de 18 aninhos, pois eu entrei na facul com 17 recém-feitos !!!
    Esse TL era exatamente como o seu Gol, completamente impecável,mas tão original que fiquei com dó de instalar sequer um rádio nele (não tinha furos de antena e nem de alto-falantes...)
    Fiquei com a viatura por quase seis meses, quando um dia meu pai chegou em casae pediu os docs. do carro (que estavam em meu nome) e mandou eu levá-lo à loja de um amigo dele(nessa época nós estávamos começando a nossa loja de carros usados), eu bobão fui lá e voltei com um cheque...De forra comprei um Opala SS 6 cilindros ano 76 e aí sim começou a grande fase de mexer com carros...
    O TL eu revi em 1999, exatos 12 anos depois, no estacionamento do Pacaembú, o carro estava à venda e eu estava com a minha esposa na época (hoje ex-esposa), comentando com ela de como aquele carrinho era igualzinho ao meu, quando o cara colocou o manual de proprietário original e a c'pia da nota fiscal, quase tive um treco:ERA AQUELE O CARRO !!
    Quis recomprá-lo de todo o jeito (afinal foi um presente do meu pai e ele tinha recentemente falecido naquela época), até tinha o dinheiro para tanto, mas a mulher estava grávida da nossa primeira filha e não deixou...
    Até foi bom não ter comprado, porque fatalmente eu teria sido obrigado a vendê-lo quando me separei em 2004...
    Na época ele tinha placas amarelas BS-9705 de SP, hoje ostenta as placas COB-1971 e está na coleção de um cara que eu não conheço pessoalmente...
    Saudades da minha "german bathtub", ou "Banheira Alemã", como os meus amigos chamavam a viatura...

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  2. Buzian, via foto da TL no seu Facebook, e achei demais. Eu hoje gosto muito destes VW exóticos, que praticamente sumiram. Quanto a recomprar, eu várias vezes perdi negócio porque não tinha dinheiro ou para não arrumar briga em casa. Felizmente eu e a patroa estamos bem, os meninos são nossa alegria. Mas eu tomei a decisão que cheguei onde queria chegar com carro antigo. Prometi para mim mesmo que não comprarei mas nenhum carro, eu já realizei o meu sonho. Um R/T (pode não ser 74, nem vermelho, mas é lindo e zero), um Dart e um Magnum clone do carro do meu avô.

    As vezes a lembrança é melhor que a posse, e com certeza teu pai está presente na tua vida de outras maneiras. Mesmo sem a TL, você tem um lindo carro, único!

    abraços !

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  3. Vital! como esse post me da animo!
    Eu chego as 2 da manhã em casa até eu ir dormir, já são quase 3 ai acordo por volta das 7:30 INJURIADO pra ir pra facudade, já pensei varias vezes em deixar de lado esse raio de engenharia, penso no charger que poderia ta comprando com a grana que to gastando na facu, mais ai a burrisse por falta de sono passa!
    Agora com esse relato seu vai passar mais rapido!
    Minha esposa também fala: se forma que você compra seu presente!

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  4. Fabrício, não abandone não! O mercado para engenharia está muito bom. Eu quis abandonar várias vezes durante o curso, que é difícil mesmo. Mas depois que você acaba, vem uma grande realização. Carro? Você tem muito tempo para comprar. Eu nunca sonhei ter os carros que tenho hoje. As oportunidades aparecem e os carros trocam de dono, todo tempo.

    abraços!

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  5. Vital, também acho que o estudo é tudo na vida. Logo que me formei engatei no mestrado e especialização ao mesmo tempo. Foram dois anos muito puxados, mas que valeram 100% a pena, pois me abriram, e continuam abrindo, portas até hoje. Só não iniciei o doutorado ainda pois exige total dedicação, mas assim que for possível o farei. Com relação ao seu gol, essas rodas eram o máximo na época, me lembro que os moleques da rua trocavam as rodas de seus gols toda hora. Se não me engano, depois desse modelo veio a moda da roda aranha e em seguida o modelo esfirra. Detalhe, todos tinham o adesivo "jet pilot" no vidro traseiro. KKK
    abraços, Max.

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  6. Isso mesmo Max. Se não ajuda, com certeza não atrapalha. Eu depois voltei e fiz mestrado. Mas acho que não tenho pique para doutoramento, nessas alturas me atrapalharia, não faria nem uma coisa nem outra direito.

    Essa roda era da Binno. antes tive BBS e depois uma outra, igual a dos Stock Cars, não lembro mais. Mas todas eram de péssima qualidade, amassavam fácil. Depois aprendi que tudo que é original de fábrica tem um engenheiro por trás, normas, qualidade, testes, ... Não troco roda de carro faz muitos anos. Aliás nem instalo som (se bem que os últimos carros que tive já vieram com esse acessório original).

    Eu não colava adesivo. Sempre deixei o carro bem sóbrio, mas lembro sim. O Gol era um carro legal, consequência da falta de opção na época. Era isso, um Uno, Kadett ou Escort. O Gol era a opção preferida entre a molecada.

    Não tinha ar, direção...mas tinha um AP 1.8, que era muito elástico e divertido.

    abraços!

    abçs

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