quarta-feira, 6 de abril de 2011

VW 1500 Azul Arara - 1973

Eu ainda não contei o final da história do fusca do meu pai, o 1300 L 1980. Mas posso adiantar que esse carro foi o mais companheiro da nossa família. Levou-me para a escola, desde os idos tempos da segunda série do primário no Augusto Laranja, passando por toda fase escolar, cursinho, até meus anos na escola de engenharia. Esse carro me levava ao trabalho, ainda que de maneira esporádica, até o ano de 1999. Foram quase vinte anos juntos.

Esse carro me lembra épocas muito difíceis de nossa família. Foi comprado no ano que meu avô morreu. Passamos todas as crises dos anos 80 com ele sempre ao nosso lado, nunca quebrou ou sequer deixou alguém na mão. Lembro-me de uma ocasião, quando ainda era aluno da Escola Politécnica, de passar por uma enchente com ele, na Av. 23 de Maio. Enquanto carros novos paravam, lá ia o valente passando pela água, sem parar! Tudo bem que o assoalho era podre e a água entrou. Mas fusca só tem lata e borracha, lavou ficou novo. Esse carro foi nosso companheiro de luta, lembro do meu pai carregando rolos de tecido nele (loucura...) nos derradeiros anos da fábrica. Não gosto nem de lembrar muito disto.

Enfim, o carro foi roubado em 1999. Foi uma tristeza muito grande para o meu pai. Mas conto essa história depois, quando achar as fotos do carro. A idéia era introduzir o motivo de eu ter um Fusca hoje.

Gostar de um Fusca é uma situação total mente emocional e nostálgica. É um carro feio, desconfortável, sem potência. Num bom dia de verão, impossível andar nele sem ensopar a roupa de suor. Cheira gasolina por dentro e não tem estabilidade. Enfim, atrativos inexistentes. Mas é engraçado como esse carro exerce um fascínio nas pessoas. Eu confesso que nunca mais imaginei ter um Fusca. Até porque eu nunca tive, de fato. O carro era do meu pai.

Mas aí entra o destino de novo. Em 2007, estava eu passeando com meu Dodge Dart. Tenho o costume de ir sempre tomar café pela manhã, na mesma padaria. Um hábito paulistano. Certo domingo, cumprindo esta rotina, paro o carro no posto de gasolina e o frentista, velho conhecido, pergunta se eu gostaria de comprar um Fusca. A resposta negativa saiu imediatamente, mas ele insistiu que o carro era bom e que eu não iria me arrepender. Fui ver o carro, por desencargo de consciência. Ele pertencia a uma senhora de quase oitenta anos, que havia perdido um filho há poucos meses. Essa, sem sombra de dúvida, deve ser a dor mais doída que um ser humano pode ter, perder um filho. Apesar do carro ser dela, o filho usava o carro as vezes. Ela já estava com idade avançada para dirigir.

Chegando na casa dela, vejo aquela cena. Lado esquerdo arriado, pintura desbotada. Vou olhar o interior, vejo um volante Panther show de horror, em compensação tinha o painel de jacarandá e os bancos originais. Levei o carro arrastado ao posto de gasolina, para examinar o assoalho. Naquele momento percebi que o carro era muito novo e já estava me apaixonando por ele. Sem falar com minha mulher, bati o martelo e comprei o carro, com um dinheiro que eu estava guardando para usar na compra de um jogo de rodas Magnum. Absurdo, o preço destas rodas era o mesmo de um VW 1500. Contei para minha mulher, que achou loucura. Levei-a a noite, passamos na porta da casa da dona e mostrei o carro, de longe mesmo. Nesse momento ela passou a gostar do feio Fusca.

Meu pai, nesta época, estava com a saúde bem debilitada. Lembro de ter ido ao hospital, no qual ele estava internado. Contei do Fusca, e claro que ele se animou. como ele não conseguia se levantar para ver o  carro, peguei um espelho da parede e coloquei na janela do quarto, e ele viu o carro através do seu reflexo.

Encostei o carro no mecânico, e por menos de quinhentos Reais o carro ficou mecanicamente zero. Fusca é impressionante, tudo de mecânica é barato. Já acabamento, a história é outra. Claro, se você exigir peças originais.


No dia da compra. Esse carro vermelho não é meu, rssss...

 O interior muito original. Mas, sem dúvidas, um carro feio!
 A Ferrari, atrapalhando as fotos, rsss....
A pintura, ou o que sobrou dela, ainda era de fábrica.

Três meses depois da compra eu já estava louco para reformar o carro. Meu funileiro, o Zé, sabe trabalhar muito bem nesse tipo de carro, mas detesta fazer, financeiramente falando. Na visão dele dá trabalho demais e dinheiro de menos. Convenci-o, e as obras começaram em setembro de 2007. O carro foi desmontado. Tudo nele é original, e rodou apenas 60 mil km. Da senhora desde zero, esse carro fez apenas duas viagens para o Guarujá. Acredito que seja verdade pelo estado geral. Apesar de feio, o motor nunca foi aberto (ou pelo menos não aparenta ter sido). Não gasta óleo e tem muita força (dentro do que pode ser forte, claro). O documento de transferência apontava ainda a concessionária Primo Rossi como proprietário anterior.

Essa foi minha primeira reforma. A única coisa não original são as rodas Mangels do Fusca mexicano. As dele não vieram com ele, estas da foto não têm suporte para as calotas parciais. É um carro que todos gostam. As pessoas na rua olham para ele e abrem um sorriso. É uma coisa inexplicável. Quando vou ao trabalho com ele, fato muito raro, todos perguntam sobre o pequeno carro. 

Incrível como ele é valente. Bateu a chave, o motor pega. O motor 1500 tem muito fôlego (lembrem que é um Fusca...) e sobe muito bem as ladeiras íngremes do bairro. É um carro que minha família inteira adora. Quando falo em vender, minha mulher pula na frente e já avisa que esse não vai embora. É um carro com história, e que me alegra muito. A reforma ficou muito boa, parece um carrinho de estante. Ficou maravilhoso. As fotos abaixo tirei no Riacho Grande, perto da oficina do Alaor, num sábado que fomos comer feijoada, eu, ele e o Vinícius. Recém saído da reforma. Hoje ele está emplacado com as placas pretas, e levou zero pelas rodas não originais, o que é muito justo.



Ao fundo, o Le baron 1981 C092.998 (10 últimos...)

Nas poucas vezes que andei no trânsito com esse carro, valorizei ainda mais o meu pai. Ele andava mais de 100 km por dia no seu Fusca, para ir e voltar do trabalho. Horas de volante, num carro de conforto muito ruim. Meu pai foi um lutador mesmo.

Depois de pronto, levei o carro para a dona ver, e foi um choque. Ela me fez um pedido. Que eu nunca venda o pequeno carro. Vou tentar cumprir essa promessa. 

Grande abraço!

Vital

18 comentários:

  1. Vital, ficou muito bonito o Fuquinha. É um carrinho muito simpático. Quando a minha irmã mais velha completou dezoito anos, meu pai deu de presente um fuca zero pra ela. Tu acredita que ela não deu nenhuma voltinha com o carro e obrigou ele a trocar o fuca por um chevette??? Muitos anos depois, ela já casada e com filhos, estava passando por dificuldades financeiras, o sogro deu um outro fuca, usado, e ela ficou das mais feliz do mundo. A vida ensina!! Andei muito no fuca dela, tenho até fotos dele quando fiz uma reforma.
    Abração
    Cuti

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  2. Cuti, meu amigo, o carro ficou muito bom, e espero que o Dart fique assim, é o mesmo pintor. Sobre a situação financeira, sem bem disso. Ficamos anos com o 1300L do meu pai. Era o nosso carro. Podre, portas com fita isolante, bancos rasgados, mas nos levava para baixo e para cima. Em 1994 reformamos o carro, que ficou maravilhoso! Mas infelizmente em 1999 ele foi roubado, nas condições mais estúpidas possíveis.

    Vai fazer um Post do VW? Manda umas fotos!

    Forte abraço!

    Vital

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  3. Poxa Vital que história bacana !! Porque remete a minha infancia, durante toda minha infancia meu pai por não ter condições financeiras de ter carros novos, sempre revezamos em casa entre Fusca e Brasilia, quando não era um era o outro, até em 1986 que meu pai trocou a Brasilia em um Passat 1981, cara pra mim foi uma sensação inexplicavel !!! O simples fato de o motor fazer menos barulho pra mim era algo inexplicável !!! kkkk !!!
    E quando fui comprar meu primeiro carro aos 18 anos qual foi ??? Um fuscão 1976 1600 (dupla carburação) com "tunagem de éṕoca" tinha rodas cruz de malta e teto solar !!! kkkkkkkkkk !!! depois desse tive outro fusca 1978 1300L que fiquei pouquíssimo tempo com ele e vendi, o motor tava extremamente cansado e não andava nada...

    Mas tenho excelentes recordações do fuscão 76... cheguei a ir pra Minas na casa do meu avo com ele !!! Cheguei morto la de tão desconfortável que é, mas foi bacana, porque enquanto um monte de carros novos estavam fervendo na beira da estrada por conta do transito num sabado de carnaval de muito sol, o fuscão tava la firme e forte !! Lembro que nessa viagem fiz o ponteiro marcar 150 km/h !!! o carro chacoalhava todo !!! kkkk !! ai fiquei com medo e tirei o pe !! rsrsrs...

    Curti o post, me trouxe excelentes recordações meu amigo !!!

    Edu Coxinha

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  4. Vital
    Alguns dias atrás estive pensando o que vou fazer quando terminar de contar as minhas histórias com os meus carros no meu blog. Tive duas idéias, ou conto as historias dos carros que arrumei de clientes, na oficina, tenho tudo registrado. Tem historias fantásticas dos carros e seus donos ou então penso em continuar o meu blog com as historias dos carros da minha família. não sei ainda.
    Abração
    Cuti

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  5. Edu, que bom que gostou da história. Apertos fazem parte da vida, e crescemos realmente é na dificuldade! Quando o Passat 76 foi embora, depois de 10 anos de serviços pesados, e foi substituido por um Monza SL/E com um ano de uso, o gosto foi muito bom! Andávamos de Monza por andar! Era sensacional. Hoje as coisas são mais fáceis, graças à ampliação da oferta de crédito, estabilização da economia, etc... Mas não podemos esquecer nossos valores.

    Grande abraço!

    Vital

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  6. Cuti, grande amigo! Acho uma boa idéia, se bem que, pelas minhas contas, você ainda está bem longe da metade. O mais legal de ter um espaço como o seu ou como este aqui é poder escrever. cara, é uma higiene mental! Eu adoro, e o estoque de carros está no final, rsss.... falta o Landau e três carros que tive durante a universidade. Depois disso, ou retornarei a algum com mais detalhes, ou contarei histórias de carros que não foram meus. Tudo vale.

    abraços!

    vital

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  7. Vital,
    O primeiro carro do meu pai foi um Fuscão 73 azul arara, ele ganhou o carro 0 km do meu avô quando tinha 21 anos.
    A única diferença entre o seu e o dele, é que o dele tinha interior branco. Ele pagava para meu tio limpar os bancos e laterais de porta com sabão de coco toda semana..rs
    Eu só tinha visto um Fusca nesta cor até hoje, o seu está lindo !!
    Abraço

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  8. Caio, eu vi poucos carros desta cor. Confesso que não gostava. Mas quando vi o carro pronto tive a certeza que fiz bem em não muda-la.

    O carro foi pintado pelo Nenê, pintor que faz serviços para o nosso amigo Carlinhos. El eé muito bom e está fazendo o meu Dart também.

    Grande abraço!

    Vital

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  9. vital,

    É incrível como existem relatos de gente da nossa faixa etária cujos parentes passaram por algum aperto financeiro e que depois compraram um Fusca que literalmente "salvou a pátria"...
    Em 1985, quando eu recém havia mudado para uma nova casa que a minha família construiu, meu pai já fazia seus "rolinhos" de carro no Anhembi aos domingos, e graças a eles ele conseguiu pagar todas as usas contas atrasadas e ainda por cima comprou um lindo Corcel II LDO 1.6 e cinco marchas, verde-primavera metálico (aquele verde bem clarinho), que era NOVO, inclusive tinha umas lindas calotas de aço inox idênticas aos dos Polara, mas com o emblema da Ford no centro, enfim...Um carro muito novo, delicioso de rodar (eu com apenas 15 anos lavava e passava meus sábados a tarde passeando com ele, adorava), mas como tudo o que é bom pode terminar de uma hora pra outra...passou menos de uma semana e meu pai saindo de casa para trabalhar acabou sendo rendido por um ladrão na porta de casa que sentou a bunda no banco do Corcel e saiu cantando pneu...
    Resultado da brincadeira: ficamos literalmente a pé, sem carro para a família.
    O único jeito foi meu pai pedir ao seu chefe que o demitisse e depois recontratasse após um tempo para que ele pudesse dar entrada em um carro financiado e assim ter alguma condução para o trabalho e para a gente. E assim foi: achou um 1300-L ano 76, bege-alabastro, bem integro mas com um enorme furo no assoalho perto da bateria (que estava quase caindo...).
    Esse Sedan foi o meu carrinho por alguns meses, e depois acabou ficando conosco por mais um tempo, já que o Corcel foi localizado quase na divisa com o Paraguai, enfim...
    Esse carrinho segurou a onda da minha família em um momento muito difícil de nossas vidas !!
    E tenho certeza de que muitas pessoas têm estórias semelhantes...
    Parabéns pelo belo Besouro Azul que tens nas mãos, guarde-o com muito carinho !!
    Abração, guri !!

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  10. Marião!!! Agora mesmo comentei no Blog do Cuti que tenho uma inveja grande de vocês, no bom sentido! Que vontade de poder ir de Dodge aí para as bandas de vocês! SP é um lugar muito complicado, você sabe disso.

    Quanto ao Corcel, temos uma perua 1984, que ganhamos literalmente acabada, quando roubaram o 1300L do meu pai. Eu era recém formado e muito durango, e mandei dar um banho bem mal dado de tinta nela. Troquei os faróis, dei um tapa na mecânica, e lá estávamos nós de Belina. Isso já faz 11 anos, e ela está firme em casa, guardada na garagem. Já escapou de ser vendida algumas vezes.

    Um Fusca é sempre algo legal. Barato, fácil de manter, e confiável. Ideal para épocas de crises. E, na boa, como prendemos nestas épocas! Como diz um amigo espanhol, sem sangue não se faz morcilla, rsss....

    Grande abraço!

    Vital

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  11. Bem bacana esta história. Um fusca é como uma bola de futebol. Você brinca, suja, usa, deixa de lado, pega de novo, usa mais um pouco e só precisa de um pouquinho de cuidado para usar novamente. Mas quando adulto, nosso sonho é ter uma novinha bem guardada e bem cuidada para podermos lembrarmos de como é bom, afinal relembrar é viver.
    Parabéns pela história e forte abraço.

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  12. Vital, toda situação difícil depois de superada nos torna pessoas melhores e mais fortes, nos mostra o que realmente importa nesta vida.
    Aqui em santo andré tem o Volksporsche, um clube bem bacana de volkswagens. Aliás é este clube que organiza a descida da serra velha de Santos, um evento muito legal. Este ano a descida seria agora no dia 10 de abril mas infelizmente teve que ser adiada devido a um desmoronamento de encosta.
    abraços.

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  13. Stabile, Max, obrigado pelos comentários. Fusca é um carro pau para toda obra, e o meu é uma bola de futebol zerada mesmo, acho que dos meus carros é o mais zero, tirando o R/T. Esse clube é legal? Meu receio é que os fusqueteiros são muito puristas. Lanterna tem que ser polimatic ou arteb, rodas de porsche? não pode... Enfim, não gosto de excessos... Mas se eles forem diferentes, acho que deve ser legal!

    Grande abraço!

    Vital

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  14. Vital beleza?
    Fuquinha é um carro muito ruim !!!!
    mais ao mesmo tempo é legal o esquisitinho, pelo menos eu acho num cabe minhas pernas direito!
    Quem num tem uma aventura dentro de um fuca?
    O seu ta muito bonito, parabéns!!!

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  15. Fabrício. Não é ruim, é muito ruim. Mas quebra um galho.. Mecanicamente é muito confiável. quanto a caber as pernas, eu tenho mais de dois metros e consigo dirigir. Fica ruim para engatar a ré. Lembro que meu pai trocou o volante do dele em 1990, quando tirei carta, colocou um original do Gol GT novinho. O original já estava com a tampa estragada. Ficou mais fácil de dirigir.

    Aventura com Fusca todo mundo com mais de trinta tem...

    abraços Fabrício! Me manda fotos do seu carro! vitalmv@ig.com.br

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  16. Vital, o Luciano, que é o presidente do clube, é um cara mutio legal. Até onde sei, todos os fuscas, desde que bem cuidados,são muito bem vindos, fora que eles organizam encontros e passeios muito bons. Coloca no goolgle volksporsche e dê uma olhada no site deles. Inclusive, o passeio da descida da serra velha de Santos, é organizado pelo Luciano...
    abraços.

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  17. Max, recebo os anúncios do clube direto. Tem muita coisa legal! O Fusca clube que ouvi que é muito exigente. Roda com ano de estampa batendo com o do carro, ... Tentei deixar meu Fuscão assim, até recomprei três rodas que eram dele, a dona as vendeu podres quando colocou radial e rodas de Itamar. Mas achei um absurdo reformar sucata. Gastei a mesma coisa e coloquei essas rodas, que levantam o carro demais.

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